No vídeo que abre o XIX Encontro de Resseguradores, promovido pela Associação Portuguesa de Seguradores (APS) e que decorreu nos passados dias 23 e 24 de maio, no emblemático Hotel Palácio Estoril, a voz feminina que se faz ouvir, dando as boas-vindas aos mais de 200 representantes das principais seguradoras e resseguradoras mundiais que participaram na conferência internacional, é vívida, límpida, elegante e empática. E é também criada digitalmente – para vincar que esta conferência internacional tem o propósito de olhar, analisar e discutir o futuro e os seus desafios. Nomeadamente as zonas cada vez mais “cinzentas” que se vislumbram no mundo contemporâneo, fruto da emergência da era da digitalização e da inteligência artificial, das tendências demográficas, da imprevisibilidade cada vez maior trazida pelas alterações climáticas e de um xadrez geopolítico cada vez mais polarizado, instável e conflituoso. Prever e prevenir riscos torna-se uma missão cada vez mais desafiante para a indústria seguradora e resseguradora, à medida que novas dinâmicas põem a descoberto áreas de desproteção das sociedades.
Coube ao Presidente da APS, José Galamba de Oliveira, dar as “boas-vindas humanas” e abrir espaço para a reflexão que, durante duas manhãs e conduzida pelo jornalista José Alberto Carvalho, pôs em cima da mesa os vários (e, em certa medida gigantescos) dilemas que o setor – e o mundo – enfrentam. Sob o mote “A Crescente (Des)Proteção da Sociedade – Respostas do Setor Segurador”, o programa juntou personalidades que, pelas suas áreas de formação e perfis diferenciados, deram nota de forma bastante esclarecedora dos desafios que se impõem às sociedades, num quadro de enorme inovação, mas de grande incerteza.
- ENVELHECIMENTO E SAÚDE MENTAL – NOVOS RISCOS OU NOVAS PERCEÇÕES DE RISCO?
Jad Ariss, Diretor Geral da The Geneva Association, o principal think thank mundial dedicado ao setor dos seguros e que acompanha as principais tendências que impactam a atividade seguradora e serve de bússola orientadora da indústria, foi o primeiro a tomar palavra, como keynote speaker. Na sua apresentação, começou por salientar que “existe um paradoxo entre os seguros e a saúde mental”, concretizando que, apesar de se estimar que cerca de “mil milhões de pessoas em todo o mundo vivem com um algum problema de saúde mental”, a relação entre o setor segurador e esta área em particular continua por aprofundar. E foi citando os muitos dados que resultaram de um estudo recente promovido pela The Geneva Association sobre o tema e que mostram que “as perturbações mentais e problemas de Saúde Mental estão a aumentar em todo o mundo, tendo a recente crise pandémica evidenciado este contexto, precipitando mais 53 milhões de casos de sintomas depressivos e 76 milhões de casos de perturbações de ansiedade a nível mundial”. Contudo, apesar disso, apenas 2% do total das despesas de saúde reportadas dizem respeito a temas relacionados com a saúde mental. Para o especialista, “continuam a existir alguns tabus”, mas o setor segurador começa a revelar “um interesse crescente pelas questões desta área da saúde em particular”, algo inevitável, principalmente tendo em conta a previsão de que os “problemas de Saúde Mental custarão ao mundo 6 biliões de dólares em perdas de produtividade em 2030”.
E se a saúde mental está diretamente ligada à saúde física (nos Estados Unidos, por exemplo, os doentes com diabetes têm maior probabilidade – duas a três vezes – de desenvolverem problemas mentais), também resultado de um contexto multifatorial. Embora, apontou Jad Ariss, sejam as gerações mais jovens e em idade ativa que, respetivamente, explicitam experienciar mais sintomas depressivos e perturbações mentais, apontando para a degradação das condições socioeconómicas, a erosão da qualidade das relações humanas afeta cada vez mais as camadas séniores da população, afetando a qualidade de vida dos mais idosos.
Na mesa-redonda que se seguiu, Alban Senn, Diretor Médico e Responsável pela área de Investigação e Desenvolvimento da Munich Re, sinalizou que, na sua visão, “não estamos necessariamente mais doentes a nível mental, mas a nossa perceção sobre estas questões é que está a mudar”. Esta realidade reflete-se naturalmente no setor segurador, tendo em conta, por exemplo, que “se tem registado um enorme aumento de baixas laborais baseadas em questões relacionadas com a saúde mental”. Senn lembrou que a indústria dos seguros tem, “neste momento, uma grande oportunidade para melhorar sua abordagem à área da Saúde Mental”, socorrendo-se de todas as potencialidades que os avanços tecnológicos proporcionados pela digitalização e pela Inteligência Artificial podem disponibilizar.
Esse foi, precisamente, o potencial apontado pela Professora Catedrática de Medicina e Diretora da NOVA Medical School, Helena Canhão, que salientou que “as novas tecnologias potenciam a capacidade de melhorar a abordagem a questões ligadas à saúde mental”, mas também o acompanhamento dos mais idosos. Lembrando que é absolutamente necessária “uma melhor rede de Saúde Mental e de apoio social, de forma a não sobrecarregar os sistemas de saúde, algo que afeta em larga escala a indústria seguradora”, a especialista em envelhecimento destaca que “há um mundo novo que se está a abrir e que pode prestar serviços às populações mais vulneráveis, completamente diferentes dos que têm sido aplicados ao longo dos tempos”.
Por sua vez, Albino Oliveira-Maia, Diretor da Unidade de Neuropsiquiatria e Investigador Principal da Fundação Champalimaud, fez questão de esclarecer que não concorda com a clássica distinção entre saúde física e saúde mental, que dificulta a clareza do diagnóstico (que deve ser sempre médico) e que dificulta o acesso destes pacientes à rede seguradora. Para o especialista, um dos grandes desafios na área mental, e em particular no setor dos seguros, é ter a capacidade de “distinguir o que é e não é doença e estabelecermos um consenso em relação a isso”, deixando um alerta: “Durante muito tempo a indústria seguradora viu-se inibida de ajudar quem está, de facto, muito doente”. E fez mais avisos: não só é preciso garantir que há mais profissionais de saúde – psicólogos e psiquiatras – para darem resposta às populações, mas também explicitar os limites da tecnologia no que aos diagnósticos diz respeito: “Não estou doente só porque o meu relógio me diz que sim.”
Já Ana Rita Gomes, Administradora da Multicare – Fidelidade, esclareceu que, apesar de ainda haver “estigmas e iliteracia”, hoje “há mais acesso a propostas do mercado segurador, que apresenta vários produtos nesta área” e que abordam diversos ângulos de atuação, nomeadamente em áreas tão diversas como a “nutrição, dormir bem, exercício físico, conexão social, etc.”. A responsável realçou ainda a importância de uma aposta na prevenção na área da saúde mental, salientando “a prevenção do risco e a deteção precoce como fatores extremamente relevantes para a atividade seguradora”. Ao mesmo tempo, apontou, o setor está cada vez mais atento ao tema do envelhecimento da sociedade, estando a procurar as melhores respostas para responder aos efeitos trazidos pelas tendências demográficas.
- “OS DESAFIOS DA INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL E DO DIGITAL”
E se a digitalização e a inteligência artificial podem ser a resposta para muitos dos problemas globais que assolam o planeta, há que perceber quais são os seus limites (sobretudo, éticos), sem deixar que a regulação refreie a tão necessária inovação. Foi com esta sempre difícil equação em mente que Inês Antas de Barros, sócia da Vieira de Almeida (VdA), com o pelouro das áreas de Comunicações, Proteção de Dados & Tecnologia, fez a sua apresentação enquanto keynote speaker deste painel. Referindo que a Inteligência Artificial (IA) “veio para ficar”, fez um retrato de um setor, o segurador, onde esta já exerce um “impacto considerável”, visto que “muitas empresas do setor usam ferramentas da IA. E lembrou que “levantam problemas e desafios de ordem ética e de regulação” e envolvem um complexo ecossistema composto por vários stakeholders, desde autoridades públicas de regulação a agentes de capacitação técnica. Para além dos desafios jurídicos de diversa ordem, a envolver temas sensíveis como a proteção de dados, e direitos, liberdades e garantias, a especialista lembrou que “há níveis de risco diferente relativamente ao uso de soluções de IA no setor segurador”. Por isso, as “empresas seguradoras têm de garantir medidas de segurança robustas na aplicação de soluções de IA na sua atividade”, soluções essas que poderão aportar enormes benefícios e potencialidades à indústria em áreas como “assistentes virtuais, recolha de dados biométricos, sistemas de avaliação ou deteção de fraude ou processamento automático de queixas”.
Juntando-se, depois, ao painel que prosseguiu com o debate dedicado ao mesmo tempo, Inês Antas de Barros salientou que, relativamente à IA, “a Europa tem um problema com dados pessoais e a respetiva proteção, uma vez que sempre legislou no sentido de limitar a sua compilação”, sinalizando que, dentro do espaço do “velho continente”, estamos “neste momento, a atravessar um período de adaptação em relação aos desafios que a IA e a digitalização levantam no que toca a direitos humanos, proteção de dados e outros”.
Esta mesma tendência de inevitabilidade de recurso a ferramentas e soluções de IA na indústria dos seguros foi confirmada e corroborada por Daniel Quermia, Diretor Financeiro da Mapfre Re que confirmou que, na companhia, “sempre acompanhámos e investimos nas novas tecnologias, de forma não só a melhorar os níveis de eficiências das nossas operações, mas também para disponibilizar aos nossos clientes os melhores serviços. Nesse sentido, temos apostado em ferramentas digitais e de IA”, nomeadamente “na recolha e tratamento de dados”, uma área fulcral para o setor. “Na atividade seguradora, lidamos com uma quantidade enorme de informação, que tem que ser devidamente compilada e tratada e, para isso, ferramentas de IA podem ajudar-nos muito a transformar esses dados, muitas vez não lineares, em informação mais sofisticada”, realçou, deixando à plateia uma conclusão em jeito de desafio: “Diria que temos de perceber em concreto o que pretendemos e o caminho que queremos seguir, de forma a saber como e em que áreas queremos utilizar a IA e as suas potencialidades no setor segurador. Ainda assim, penso que as grandes decisões finais continuarão a ser tomadas por vontade humana”.
Por sua vez, João Saraiva, Diretor de Transformação e Diretor de Advanced Analytics da Tranquilidade/Grupo Generali, ressalvando que “a IA não tem sensibilidade humana, algo muito importante, por exemplo, na criação artística”, concordou que as ferramentas e soluções proporcionadas pela IA “são especialmente relevantes no setor segurador, nomeadamente pela sua capacidade de recolha e tratamento de dados”. “O setor dos seguros, que tem o ADN dos dados e trabalha com uma infraestrutura brutal de gestão de dados, é perfeito para fazer crescer a inteligência artificial”. A IA oferece à indústria “a enorme capacidade de extrair macrotendências, de entender como é que a sociedade está a evoluir em relação às organizações, e, a partir disso, ajustar a oferta, fazer a prevenção do risco. Este grande volume de dados que nós próprios geramos, e que também podemos adquirir de várias formas, embora não violando o direito do cliente à prevenção do cliente, podem levantar naturais questões éticas que merecem ser discutidas”.
Pelo que há a necessidade, também defendida por Inês Antas de Barros, de construir uma relação entre indústria e consumidores que seja forjada na confiança. A tecnologia, defendeu João Saraiva, tem o poder de mudar o mundo. Sem precisarmos de “sair do nosso paradigma atual. O ser humano é o elemento fundamental do trabalho e da geração de valor, auxiliado pela tecnologia. A inovação, com base na inteligência artificial, não tem a sensibilidade humana.”
Tomou, então, a palavra, Rui Monteiro Lopes, CEO e Fundador da AgentifAI, tecnológica portuguesa que desenvolveu a Alice, um inovador robô de inteligência artificial que, através de linguagem natural, interage com os clientes da banca e da saúde – em português, inglês ou espanhol, por telefone, email ou caixas de conversação – e é capaz de auxiliar numa série de tarefas complexas (incluindo marcações de centenas de diferentes atos médicos ou fazendo operações financeiras), mantendo a noção de contexto. Longe de ser um simples bot, designação que não aprecia particularmente, o empreendedor lembra que, apesar de aparentemente simples, esta tecnologia é altamente complexa e implica a capacidade de aprendizagem das máquinas. “Para a marcação de uma consulta médica é preciso reconhecer as diferentes especialidades e, dentro de cada uma delas, as suas nuances. Por exemplo, a ortopedia. É o joelho, a perna, o braço? E, depois, qual é o convénio? E que parâmetros dentro do mesmo? A seguir, a disponibilidade dos médicos ou de determinado médico. Mais a disponibilidade do paciente. Em interações em que nem sempre as palavras são exclusivamente em português ou em inglês. A complexidade é enorme.” Atualmente, orgulha-se, a tecnologia portuguesa já conseguiu desenvolver um sistema suficiente robusto através do qual “pessoas de 80 anos conseguem já marcar consultas por telefone”.
Se em setores de atividade, como o das seguradoras, já se atravessa “uma fase em que já não há capacidade de resposta e atendimento sem automatização dos processos através da IA”, Rui Monteiro Lopes defendeu que, antes de mais, esta “pode e deve ser utilizada proactivamente no sentido preventivo”, argumentando que “esta tecnologia pode ser usada não só de forma reativa, mas de forma proativa”. Mas não esquece as consequências menos positivas que terá. “A IA vai ter um impacto no mercado de trabalho. É certo que há um benefício para a sociedade, para a economia. Está a construir novas empresas e novas possibilidades. Mas a sociedade não deve, de maneira nenhuma, só ter uma visão otimista do assunto. Há risco e há impacto”, avisou.
- “CATÁSTROFES NATURAIS – O GRANDE DESAFIO”
No segundo dia da 19.ª edição do Encontro de Resseguros, que a APS organiza desde o início da década de 1980 e que decorre bienalmente, o foco da discussão manteve-se nas “zonas cinzentas” e mais desprotegidas de um mundo cada vez mais assolado por fenómenos climáticos extremos, cuja imprevisibilidade deixou há muito de responder a modelos estatísticos. Michael Walz, Gestor de Produto Sénior e Vice-Presidente da Swiss Re, como keynote speaker deste tema, deixou um retrato bastante explícito das alterações climáticas: são uma realidade e os seus efeitos fazem sentir-se globalmente. Deixou provas: “2023 foi o ano mais quente desde o início dos registos globais em 1850, por uma larga margem”, “os 10 anos mais quentes” desde que há registos “ocorreram todos na última década” (2014-2023).
Relativamente a Portugal em particular, Michael Walz clarificou que o País está alinhado com a evolução registada globalmente que respeita aos efeitos das alterações climáticas e às tendências de aquecimento global, como comprovam episódios recentes no país, salientado que “a Península Ibérica é já uma região de risco, mas as condições vão e estão a agravar-se na região”, dando como exemplo “anos cada vez mais secos, que potenciam mais e maiores incêndios”. Naturalmente, e tendo em conta que “todos os riscos ambientais vão aumentar a intensidade e a regularidade no futuro”, o especialista deixou um alerta muito claro e diretamente dirigido às seguradoras nacionais: “Portugal e a indústria seguradora local estão especialmente expostos aos danos e prejuízos de catástrofes naturais e desastres naturais”.
Na conclusão da sua apresentação, realçou que, neste contexto de urgência climática global, e com uma “tendência crescente de perdas causadas por catástrofes naturais, relacionadas com o clima, exige-se a capacidade de todos se adaptarem às novas exigências” e “numa colaboração entre vários setores da sociedade, num processo em que o setor dos seguros pode assumir um papel de liderança” através de novas abordagens (como, por exemplo, o investimento em tecnologias verdes), através de influência junto da esfera política e de uma maior sensibilização para os riscos.
Repto também lançado por Helena Freitas, Diretora do Parque de Serralves e Professora Catedrática na área da Biodiversidade e Ecologia da Universidade de Coimbra, no painel que se seguiu. Alertando que “é muito importante o compromisso global no caminho de reconciliação com o planeta”, sublinhou que “a política ambiental tem de ser encarada como um projeto regenerativo, transformativo e sistémico”. Para a especialista em biodiversidade, “no contexto ambiental atual, não há nenhum setor hoje onde não se sintam já os efeitos das alterações climáticas”, deixando bem claro que, “de facto, em todos os contextos das nossas vidas, vamos ter de nos adaptar, mas sem ignorar os esforços de mitigação dos efeitos”. E “isto é um desafio tremendo”, concretizou. Relativamente ao setor segurador no atual contexto de urgência climática, Helena Freitas sinalizou a importância de se investir e de se fazerem “apostas na literacia técnica e financeira de conceitos como risco ou prevenção de risco, havendo aqui em particular um esforço coletivo a fazer, a envolver vários stakeholders”.
Por sua vez, Pedro Matos Soares, Professor no departamento de Engenharia Geográfica, Geofísica e Energia da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, relembrou que ainda “radica na nossa sociedade a falta de empatia com a questão ambiental e climática e não percebemos que fazemos parte deste sistema ambiental”. Para o também Investigador Principal do Instituto Dom Luiz, “fomos educados e habituados a esta dissociação, algo tremendamente nefasto para lidarmos com as alterações climáticas”, destacando que é necessário “estabelecer um nexo entre mitigação e adaptação climática”. O especialista, que foi um dos mentores do Roteiro Nacional para a Adaptação 2100 – RNA2100 (que pretende definir as vulnerabilidades e impactos das alterações climáticas em Portugal, por forma a avaliar as necessidades de investimento para a adaptação e a apoiar políticas públicas de adaptação climática) reforçou que uma subida da temperatura média do planeta na ordem dos 1,5 graus ou 2 graus significaria que “mais mil milhões de pessoas vão ficar expostas às suas graves consequências, deixando de ter acesso a água, somando-se a este flagelo as consequências nefastas dos incêndios, períodos prolongados de seca e outros fenómenos ambientais” que provocarão “excessos de mortalidade dantescos”.
Tendo este cenário em conta, e no caso concreto do Portugal explicitando as ameaças decorrentes do galgamento de zonas costeiras e do aumento exponencial de episódios de inundações, o especialista deixou alertas, em especial para o setor segurador, no que concerne a futuras “perdas de produtividade importantes em setores vitais para a economia, como o turismo, construção ou agricultura” – apontando especificamente para dois dados previamente referidos pelo keynote speaker da sessão, Michael Walz: globalmente, as perdas económicas causadas pelas catástrofes naturais mundiais, num único ano (2023), foram equivalentes ao Produto Interno Bruto português (276 milhões de dólares americanos), sendo que menos de metade, neste caso o equivalente ao PIB da Bulgária (108 mil milhões de dólares) foram indemnizados pelos seguradores.
Pedro Garrett, co-fundador da 2adapt, uma startup tecnológica portuguesa que trabalha na área da adaptação climática, ajudando municípios e entidades nacionais a preparem-se para os efeitos climáticos, lembrou que “sempre que trabalhamos em risco e mitigação das alterações económicas, estamos sempre a trabalhar em adaptação, algo que envolve avaliação, implementação, monitorização – e constante ajustamento”. Abordando a questão em particular dos custos dos desastres naturais e fenómenos ambientais extremos, Pedro Garrett defendeu que “devemos sempre reajustar as nossas medidas”, dando como exemplo concreto o caso da Madeira, ilha há uns anos altamente fustigada por chuvas e inundações intensas e que nos últimos tem promovido avultados investimentos em infraestruturas de prevenção adaptadas a projeções e previsões que já levam em conta o atual cenário ambiental global. As inundações de 2010, num cenário de precipitação média de 270 litros por metro quadrado, provocaram danos superiores a 1.000 milhões de euros. As seguradoras colmataram 135 milhões em perdas e foi necessário investir 125 milhões de euros nas devidas adaptações das infraestruturas, por forma a diminuir o impacto de possíveis e futuro fenómenos de intensa precipitação. Mas essas adaptações tiveram por base projeções futuras, de cenarização a longo prazo, caso contrário ficariam rapidamente desajustadas. Em 2023, aquando da passagem da depressão Óscar pela região autónoma da Madeira, que estabeleceu um novo recorde nacional de precipitação (em média, 355 litros por metro quadrado), as infraestruturas não cederam e o episódio extremo passou sem consequências de maior. “A adaptação climática é fundamental”, vincou.
Já José Luís Leão, abordando a temática da crise ambiental e desastres naturais pelo ângulo da indústria dos seguros, lembrou que uma das suas “missões é reforçar e salientar a importância dos seguros em qualquer economia desenvolvida”. Ainda assim, o Diretor de Corretores e Parcerias do Grupo Ageas Portugal ressalvou que a necessidade de promover uma maior e mais eficaz literacia financeira, uma vez que “as pessoas olham para o seguro como uma despesa ou obrigação legal”, lembrando que “as economias mais desenvolvidas apoiam-se e recorrem consistentemente ao setor segurador”. Neste quadro, e sublinhando que uma das funções do setor segurador “é gerir risco e transferir os respetivos custos”, o orador referiu ainda que o nosso país tem um caminho a fazer nesta área, uma vez que “Portugal não surge bem classificado nos índices europeus, no que toca à penetração do setor segurador na economia”.
Mais uma conversa animada e bastante eloquente nos alertas deixados. Uma reflexão constante ao longo desta conferência internacional, que seria encerrada por uma conversa entre dois especialistas em geopolítica, Paulo Portas e Miguel Monjardino. Sobre as suas intervenções, damos nota no texto seguinte.